13/12/2014

ausência


quando se ausenta
de casa
não sinto alívio
 alguma espécie
de prazer interior
sinto avolumar
o vazio:
da intimidade
do quarto
ao convívio exterior


h.f.
13 dez./2014


02/12/2014

(Des)pertencer


mal sinto caber-me
o meu espírito
asa
acorda-me à centelha
de outra casa
lá, portas e janelas
desvão
o teto é varão "cem" estrelas


h.f.
31 mar./2013



*Do livro Poemas de: chamados, esperas & (a)fins. Sem previsão de publicação.


29/11/2014

guitarra



Steve Clark, Def Leppard

que essa voz
aguda
rasgada
levemente dissonante

penetre-me visceral
e alucinante

da intuitividade
à racionalidade
animal

h.f.
29 nov./2014






26/11/2014

offline


Você não entendeu quando disse que a história era tardia... Pela novidade, destinava-se ao esquecimento. Você não entendeu o porquê da recusa e do meu silêncio. Evaporou na tarde difusa... sem manifesto ou lamento. Sem dar-me o direito da dúvida, de convencer-me quão vazia pode ser a vida sem você. Eu estava offline... fora da linha do tempo. Bastava um clique, um toque de alumbramento, para arrancar-me dos dias crus, − opulentos. Da nuvem espessa sobre o arco-íris da vontade. Da estiagem insensível à chuva, − à distração do vento. Eu estava offline, mas vi quando você me (des)ligou...



h.f.
26 nov. 2014




P.S.
Uma música, hoje tanto quanto piegas (ah o amor e seus paradoxos...), para quem distraidamente vive "a se morder de..."

09/11/2014

Pudera...

Arte: George Braque


Pudera fundir-me, a língua, à tela difusa
Dotar-me das histórias que não têm fim!
Despir-me da neve que à paixão reclusa,
Que crespe as cordas do meu bandolim.

Pudera profanar a tez, − textura marfim.
Suprimir do enleio a desventura de musa
Do devaneio que ateia, ora me parafusa
Que sapateia ao que não, ainda que sim.

Pudera executar balada nobre e incisiva:
Canção que lasciva tua distinta memória
− E furtiva dissabores da razão seletiva.

Pudera ceder às flores que amas ilusória,
Render-me aos fulgores da cama evasiva:
Que trama, saliva − proclamas em glória.



h.f.



*Soneto iniciado em jun. de 2014.

16/10/2014

à margem


que as águas rolem
acalantem o silêncio
das pedras
à margem
das concordâncias
e burburinhos


h.f.
16 out./2014


11/09/2014

(re)nascimento


o castelo
esplendoroso
um dia
desmoronará

e, das ruínas,
se erguerá

um outro povo


h.f.
11 set./2014


22/08/2014

Desejos infantis


A cada dia me torno mais estranha. A cada dia já não reconheço a minha face adormecida na amplidão. A cada dia sinto-me menos fluída; e me nego, um pouco mais, à contemplação. A cada dia me desinteresso por coisas sensatas. E por coisas não sérias também! A cada dia apresento menos tolerância; para não dizer: desdém! A cada dia choro em meu silêncio. E clamo uma nova cor e ideia. Contrariamente, tarda-me chegar a primavera. E, com ela, a luz e a chama de uma vela. Assim os meus dias vão passando: sem serenidade, dormência ou engano. Assim os meus dias vão perdurando... (enquanto choro em meu silêncio), os meus desejos infantis e secretos planos.


h.f.
1 ago./2007



*Texto revisitado.

rendição


lua
se eu fosse
rua

caía na lábia
sua

antes que a Via-Láctea
evolua


h.f.
21 ago./2014


05/08/2014

In_variável

a Marcus Vinicius, companheiro de vida.


Não é porque a noite se mostra negra que esqueço o brilho das estrelas. Não é por não dispor de chaminé que desacredito em papai Noel. Não é porque o Sol se enfada, se deita, que anuncio novo dia. Não é porque a lua se apresenta gueixa, que afago cometas e vaga-lumes. Não é por essas e outras coisas que amo esse mesmo outro homem.



Esqueço o brilho das estrelas porque a noite se mostra negra. Desacredito em papai Noel por não dispor de chaminé. Anuncio novo dia porque o Sol se enfada, se deita. Afago cometas e vaga-lumes porque a lua se apresenta gueixa. Amo esse mesmo outro homem por essas e outras coisas.




*Texto reeditado, a versão original é de 27 ago./2009. 



16/07/2014

O ESPELHO


– reflexo de si mesmo,
que inscreve o outro em mim
dia a dia
noite a noite;
madrugadas a esmo,
enfim –

reluz
embaça

esvoaça trovas e trovoadas
às palavras que, íntimas, se reconhecem
ditas
ouvidas
dilaceradas...

porque urgência é reconhecer-me

face a face
verbo a verbo
do verso ao ato, – ao sexo

em sua língua
tato
.......................reflexo


mas a contingência arrefece também a miragem...
o objeto, a sensação; a palavra adejante ao espírito,

– à carne

que se inscreve tardia e delirante no cio

possa eu luzir no espelho
chama vela
pavio?

inverno
que é simultaneamente estio?

primavera

de
.......rio
..........som
..............brio?

beleza
que se anela à linguagem do corpo
febril?


possa eu a porção (im)pronunciável do vazio?...




h.f.
14 mai./2014




29/06/2014

quase


é essa
condição que não passa
trem que não se pega
voz que enlaça
ora relega

é essa quase história,
– quase novela
atração que devassa
ora anela


h.f.
29 jun./2014


24/05/2014

Capitu


DAR-TE-IA, meu amor,
os meus olhos baú de ressaca

chamar-me-ias

Capitu,

cigana oblíqua e dissimulada


h.f.
24 mai./2014


08/05/2014

importa sim...





IMPORTA, importa sim...

padeço das ânsias
da dor

das lonjuras
e inquietudes

desse estranho amor


h.f.
8 mai/2014


07/05/2014

até na forma...


NOSSOS caminhos
se cruzam
como olhos farejam
o deleite
o aninho durante
e pós 
tempestade
até na forma, não vê?
se evidencia alguma
potencialidade...


h.f.
7 mai./2014


se desdigo


DE um modo
ou outro...
eu digo
e se desdigo
(o dito
e o não dito)
é porque corro
perigo


h.f.
6 mai./2014

Encantamento, poema de Graça Pires

Nesta quarta-feira (07/05/14), recebi o livro “Poemas escolhidos”, da poetamiga portuguesa Graça Pires, do blog "Ortografia do olhar". 

O livro veio de Parede/Portugal, e chegou-me acompanhado de uma bela dedicatória, poética como é Graça Pires.


A obra apresenta-se constituída por textos selecionados, pela própria autora, de sua criação poética, extraídos do conjunto de 12 livros publicados ao longo de 1990 a 2011.

A seguir, um poema que me (en)cantou os sentidos ao primeiro vislumbre de olhos:



ENCANTAMENTO

Amanhã, quando o chão
for a construção da nudez
e houver, entre os seus olhos
e os meus, um súbito musgo,
não se repetirá, meu amor,
o cambalear das palavras na garganta,
nem diremos a interdição dos lagos
na saliva esgotada no sal.

Alguns corpos inventam
a dimensão incondicionada da noite,
exposta e cúmplice como a terra.

Nós saberemos, lentamente,
o mel inquietante dos dedos.


Graça Pires.
In: “Poemas escolhidos”. 2012, p. 13.






À poetisa Graça Pires, o meu muitíssimo obrigada. 
Lerei o livro com a imensidão dos afetos, da poesia que une além-mar.


Abraço terno,
Hercília Fernandes.





por tanto...


DÓI.
mas dói tanto, 
tanto...
cada parte de mim
é o fim
que acalanto.


h.f.
7 mai./2014


06/05/2014

ânsia


TALVEZ seja eu
que sonhe demais
que queira demais
que exija até mais

mas talvez seja só eu
que perca os dias
as horas
os instantes

a paz


h.f.
6 mai./2014


05/05/2014

O constante diálogo


e bateu o estranhamento...
o nosso melhor diálogo
ainda é (com) o silêncio.

h.f.
5 mai./2014



Escolhe teu diálogo
tua melhor palavra
ou
teu melhor silêncio

Mesmo no silêncio e com o silêncio
dialogamos.

Carlos Drummond de Andrade,
In: "O constante diálogo" (fragmento).


24/04/2014

Pegasus

Pegasus, by SMcNonnahs

EU sempre imagino
que você virá
forte
reluzente
destemido
livrar a mocinha
do calvário que é viver

porque só você...
é capaz de entrever
o termo correspondente 
ao significado
do que, à menina,
faz doer


h.f.
24 abr./2014

22/04/2014

alegoria


MAS TALVEZ
o anjo da história
torne às vestes de vampiro

e, do sangue esquecido,
restitua a memória dos mortos


h.f.
22 abr./2014


Anselm Kiefer, "Book With Wings", 1992-94


Minha asa está pronta para o voo
De bom grado voltaria atrás
Pois permanecesse eu também tempo vivo
Teria pouca sorte.

Gerhard Scholem, Salut de l’ange
[Saudação do Anjo].



15/04/2014

Da condição necessária

Vênus de Milo. Museu do Louvre, Paris.

TRISTE condição
a da musa...

fonte inestimável
de inspiração

mas amor palpável
é mister à recusa


h.f.
15 abr./2014


rubor


E A LUA (toda
prosa)
mal conseguia
disfarçar
o rubor do 
deslumbramento

chegada era a hora
do acasalamento
que poder-se-ia
supor
ter-se-ia a qualquer
momento


h.f.
14 abr./2014

11/04/2014

invasão


ESSA fraqueza
que me invade

tem nome
presa
voracidade

a fome e a vontade de.


h.f.
10 abr./2014



*Imagem disponível no Google sem indicação de autoria.

03/04/2014

predisposição


SOU mais das tardes
noites
madrugadas

manhãs? quão lindas!
se serenatas!...


h.f.
2 abr./2014


02/04/2014

sublinhado


A PROPOSTA, à beira da indecência
o sonho, tão circunscrito...

lua rito sol aurora

grifo


h.f.
2 abr./2014


24/03/2014

alquimia


DEI-TE rosas.
Ventos em procissão.

A primavera:
lâmpada louca, cega;

Vela de contemplação.

Dei-te o mar.
Dei-te beija-amores.

Dei-te estrelas na tarde.
Dei-te riso, siso, fabuladores...

Dei-te especiarias:
ouro, prata, cristal, pedrarias.

Cada flor-metal em romaria.

E o meu pranto quieto, inquieto
transmutado em alquimia:

- Deitando-me!...


h.f.
16 dez./2007



*Poema que integra o livro "Maria Clara: uniVersos femininos" (2010). Versos revitalizados em 24 mar./2014.

14/03/2014

Homenagem aos poetamigos

Com os versos de "Manhã" e "Nada Há Que Ser Dito", poemas que integram o livro "Nós em miúdos" (Editora Patuá: 2013), homenageio a todos os poetamigos neste Dia Nacional da Poesia:

"Child with a Dove"
(Marc Chagall)


ELA [a poesia] não me pertence
[sequer me deseja provar]
parte madrugada à deriva
galo canta:
hora de acordar

(p. 111)



ELE escuta silêncio
o sentido de não palavras: das negativas 
às afirmações
compreende a longevidade nas pausas 
pela brevidade da demora
sabe que, entrelinhas, há uma ponte cujas águas
vêm de fonte cristalina
e há, ainda, a chama o chamado e a bruma
a névoa que recobre floresta e habita pássaro
e o pássaro voa noite adentro e se esconde 
no tardar dos primeiros raios
porque jaz o sol, ele vem de outra ordem...

(p. 110)



hercília fernandes


10/03/2014

garantia


GUARDEI as suas palavras
como forma de impedir os
mesmos erros

mas aqui faz frio e é só
o começo:

de uma longa caminhada,

vida a esmo


h.f.
10 mar./2014

sem aviso

QUANDO você voltou
cerca de dois anos atrás

senti que a paixão 
nos enlaçava até com maior
força

senti-me novamente
enamorada:

mulher amante
moça

você, meu homem:

menino poeta
rapaz

mas era prematuro 
pretender algo mais

a realidade veio também
sem aviso

e fez da paixão muro
diviso 

desilusão


h.f.
10 mar./2014


08/03/2014

Ou, vice-versa...


NÃO ALMEJO rosas, nem chocolates e laços e fitas
Quero a vida com mais prazer e menos fadiga!
Que durante o dia saibamos nos regozijar 
com o trabalho realizado em parceria 
E à noite, ou mesmo hora qualquer do dia,
tenhamos as delícias à mesa, à sala de estar,
à cama, à varanda, à lavanderia...
Amor bom, ardente e solidário, ocupa frestas
atravessa vãos, armários, 
do quarto à cozinha

Ou, vice-versa...


h.f.
8 mar./2014


04/03/2014

sentimento à revelia


EXISTE
porque o sentimento resiste
à revelia do tempo
dos contextos imediatos
que nos fazem inteiros
ora dividendos
porque vive
um ser único:
terno e selvagem
em mim


h.f.
3 mar./2014

24/02/2014

só (r)estou


PERDI o chão
o rumo
as palavras

só (r)estou

:

meu livro de mágoas


h.f.
24 fev./2014



sandice


ENQUANTO você sonha
me devora em sua sandice calado
eu ponho meus óculos de sombra
e me afogo na superfície
do aquário


h.f.
21 mai./2009



*Do livro Nós Em Miúdos (Editora Patuá: 2013). Prefácio do poeta Lau Siqueira.

23/02/2014

'cem' des_culpas


E NÃO adianta vir
com esse olhar de quebra-
ossos

com essa quase presença
que produz fraqueza,

oficina do ócio

com esse grave que sensualiza
ora é mórbido

com essa cara de quem foi só até a esquina


h.f.
23 fev./2014



15/02/2014

saldável

A PALAVRA era fugidia
demasiadamente vaga,
embora tardia

não era o que a minha
alma sonhadora sol_via
nem o corpo imperfeito,
debalde, pretendia

era uma palavra sadia...
sem sinais de combate,
cansaço

nem esquizofrenia...


h.f.
em idos de 2009.

10/02/2014

por gosto


ESQUECI seu nome
rosto
endereço

se cedo ou tarde

fim
ou começo

esqueci de mim
e por gosto pereço 


h.f.
10 fev./2014

02/02/2014

Mar de chuva e sóis

A luz no corredor
A porta entreaberta
A sala quase deserta
O relógio na parede
O perfume ainda no ar.

A cadeira de balanço
Os óculos no armário de estanho
A fumaça do cigarro
A canção no rádio
A foto 3X4
O abajur, as cortinas, o porta-retrato.

A mesa na sala de jantar
A TV em preto e branco
O sofá, o centro, o candelabro
E os meus tamancos.

A gravata amarela e a sua seda azul.

O colarinho em desalinho
O paletó em puro linho
O vinho tinto, a alva porcelana.

Os discos de vinil
Carlos Gardel na vitrola
O velho e bom colchão de mola
A colcha de "chenil".

Os bordados nos lençóis
A purpurina, a lamparina, o brio.

Rosas, borboletas, girassóis...
Mar de chuva e sóis no meio de nós.


Hercília Fernandes



*Poema classificado em 5° lugar em Concurso Literário Internacional, promovido por Arnaldo Giraldo (Edições AG), para composição da antologia "Ritmo Vital" (All Print Editora-São Paulo, 2007, p. 118).

"O sonhador, em seu devaneio, não consegue sonhar diante de um espelho que não seja profundo."

(Gaston Bachelard)